“Redes sociais geraram a escalada da mentira deliberada”, alerta Luís Roberto Barroso.
Ambiente de interação e pesquisa entre mestres e estudantes, o Centro Brasileiro de Estudos Constitucionais (CBEC Membros), do Centro Universitário de Brasília (CEUB), recebeu juristas de renome para aprimorar o debate sobre os impactos da internet e das redes sociais no estado democrático de Direito. A pauta provocou grande reflexão com temas que envolvem liberdade de expressão, desinformação, algoritmo e pós-verdade. O encontro, realizado nesta quinta-feira (23), reuniu um qualificado grupo do Judiciário brasileiro: ministro Carlos Ayres Britto, ministro Luís Roberto Barroso, ministro Luiz Fux, Prof. Me. Rodrigo Janot e o senador Sérgio Moro.
Luís Roberto Barroso descreveu a democracia constitucional como a ideologia vitoriosa do século XX, destacando sua face constitucional, que defende os conceitos fundamentais, e a outra, que significa a soberania popular. “A democracia não se resume à vontade da maioria, mas também pressupõe os direitos fundamentais e a proteção e preservação do estado de direito. As democracias contemporâneas são feitas de três dimensões: votos, direitos e razões”.
No que diz respeito à ascensão da revolução tecnológica e aos perigos da desinformação, o ministro do STF afirmou que, a partir da tecnologia da informação e da biotecnologia, há um “admirável mundo novo”, que também tem o lado positivo e negativo. “Algoritmo é uma palavra que não conhecíamos até anteontem e está se tornando o conceito mais importante do nosso tempo. Há anos, as empresas mais valiosas forneciam petróleo e fabricavam automóveis. Hoje as empresas mais ricas são as que produzem tecnologia e mídias sociais”, afirmou.
O membro da Suprema Corte comentou o fenômeno da Inteligência Artificial, ferramenta que, segundo ele, vai transformar de maneira profunda e imprevisível a vida das pessoas. “Perguntei ao ChatGPT o que eu pensava em matéria de Direito Constitucional. O robô me deu com quase perfeição as minhas próprias ideias, explicadas de modo que talvez eu não conseguiria”.
Sobre as mídias digitais, Luís Roberto Barroso avaliou que o maior impacto acontece no campo da comunicação social e da imprensa, para além das relações interpessoais. Ele afirma que a internet revolucionou o acesso à informação, ao conhecimento e aos espaços públicos. Por outro lado, conforme apontou o ministro, também permitiu a escalada da “mentira deliberada, da intolerância, da violência, do assassinato de reputações, de condutas criminosas e de teorias conspiratórias”.
O jurista criticou a “tribalização da vida”, ao se referir ao conteúdo direcionado a um público específico e temas que corroboram o gosto e o estilo de vida de cada usuário. Segundo ele, com essa entrega dos algoritmos das redes sociais, as pessoas acabam falando só para si e para os seus, muitas vezes com narrativas falsas. “Mentir precisa voltar a ser errado. A democracia não tem espaço para a mentira deliberada”, reforçou.
Membro da mesa do CBEC, o ministro Luiz Fux ressaltou que a viralização da desinformação viola completamente o princípio de democracia. Segundo ele, a informação verdadeira forma o voto consciente, que celebra o estado democrático, e o papel dos agentes democráticos é lutar pela vida dos que sofrem e dar esperança aos que querem sobreviver, não o contrário. “A era da pós-verdade é a era da mentira. Não existe pós-verdade. Crime se controla, se enfrenta e vai acontecer do mesmo jeito com o crime de notícias falsas”.
A regulamentação da internet está sendo discutida no Congresso Nacional e, na visão do senador Sérgio Moro, o caminho para ampliar o debate entre parlamentares e a sociedade civil é a educação e a adaptação aos moldes atuais de acesso à informação. “Hoje enfrentamos questões antigas sob uma nova roupagem. Devemos discutir melhor o combate à desinformação para que, diante dos efeitos colaterais gerados, os remédios possam ser institucionais”, declarou Moro. Sob a mesma ótica, Barroso defendeu a regulamentação da internet como forma de proteger a privacidade das pessoas e impedir conteúdos de ódio, intolerância e que ataquem a instituição democrática.
– Agência Brasil